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(Tau-te-King, 16)


sexta-feira, 22 de agosto de 2008

: : wall.E : : o poder de um Amor Sublime aliado a uma proactiva capacidade crítica individual : :

De vez em quando, lá vou eu com a minha menina ver um filme para crianças (houve um tempo em que eram os únicos que via, sei de cor e salteado todas as versões do Shrek, as músicas da Ariel, enfim, o que "faz parte do programa" de uma maternidade vivida com muito Amor, orgulho e dedicação, como diz um grande amigo nosso...). De qualquer das formas, sempre adorei BD e animação (computorizada ou não) e muitos dos meus heróis de infância, que permaneceram como âncoras mnemónicas simbólicas, fazem parte deste maravilhoso universo.









Ontem, vimos o wall.E e adorei esta nova película da Pixar em parceria com a Disney- a história de uma pequeno robot que ficou esquecido na Terra e que, com muita criatividade e luz interior, criou um poético mundo próprio num ambiente desolador circundante, tendo como única amiga uma barata, como sonho as estrelas, apenas vislumbradas quando da momentânea dissipação da poeira tóxica, arriscando a própria vida (sim, porque mais do que qualquer outro ser, este pequeno robot revela uma vitalidade invejável), ao lutar pelo Amor de Eva, uma adorável sonda que não pertence ao seu mundo, comoveu-me deveras. Adorável criatura que vem catalisar a disrupção da sua pragmática rotina diária- a construção de enormes arranha-céus de sucata-, apenas quebrada pela colecção de singelos objectos que vai recolhendo no meio do lixo e que guarda no seu lar, um barracão que compartilha com o amistoso insecto e onde guarda uma das suas relíquias- um musical dos anos 50 protagonizado por um par apaixonado, afinal, um dos primordiais motores da humanização de wall.E, materializada num comovente aperto de mãos.



Notei, também, outros pormenores deliciosos neste filme: os humanos que partiram na nave vivem numa sociedade hedonista levada ao extremo, onde a total computorização da existência lhes facilita de tal forma a vida que a obesidade os remete a um leito electrónico ambulante, perdendo a capacidade de locomoção vertical, vivendo as relações e as sensações unicamente de forma mediada. Quase que me arrisco a afirmar que os autores se inspiraram, certamente, na obra fenomenal de Aldous Huxley- O Admirável Mundo Novo- ou, talvez, em alguns fenómenos que nos ameaçam a todos, caso sucumbamos absoluta e cegamente aos seus encantos desumanizantes, apesar de, aparentemente, apelativos.

E quais são os elos que levam o caos a toda esta ordem asséptica de um cosmos vazio apenas canalizado para um prazer minorizante, uma vez extremado? Uma planta, uma simples planta e O Amor de Wall.E e Eva. A coadjuvação entre a fotossíntese e um Amor Sublime porque incondicional são o motor de uma fenomenal disrupção vital.


Quando da luta com o despótico e sistemático computorizado leme, o comandante, cuja farda lhe está já tão reduzida que a usa como xaile, após saber por Eva que a Terra já está habitável, enuncia algo admirável, porque essencial na sua simplicidade: "Eu não quero sobreviver, quero viver".

Noto, igualmente, o pormenor delicioso do papel disruptor dos robots disfuncionais, remetidos a uma espécie de sanatório virtual, que, coadjuvando a revolução instigada pela existência da pequena planta e pelo Amor que une wall.E e Eva, colaboram na reedificação da verdadeira, mas esquecida, missão de toda aquela gente remetida a uma obesidade mórbida desvitalizante e a uma alienação colectiva minorizante: regressar à Terra, à naturalização, enfim, a uma essencial humanização. Ironia das ironias- são estes assistémicos robots, criados para servir os humanos, remetidos a um processo de gradual, mas intensa, desumanização, os motores do seu regresso às origens biológicas.
Afinal, intemporalmente, sempre foram os assistémicos os grandes empreendedores, os móbeis da evolução da humanidade quer no campo religioso, quer no científico, quer no político, quer no artístico, que esteve sempre nas mãos da diferença individual que cativou a regularidade asséptica sistemática gregária, caso contrário, ainda estaríamos, hoje, de cócoras a comer carne crua dentro de uma caverna infecta plena de sombras.


Este filme é, assim, todo ele um muito simples mas ternurento manifesto humanizante: só a capacidade crítica activa individual, um Amor Sublime e a vitalidade que, inexoravelmente, nos inculcam, conjugados ao respeito pela vida e ao encanto pela diversidade alheia, poderão salvar sujeitos alienados pelos apelos sistemáticos e ilusórios da matéria. Fiat lux!

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