Estando a reler O Vale Abraão, de Agustina Bessa-Luís, a minha eterna mais legítima candidata nacional ao Prémio Nobel da Literatura, pelas qualidades literárias e humanas (nunca afirmadas em discursos auto-panegíricos ou vaivades vácuas (VV) (confesso, o que mais me enerva no Saramago, para além, daquele olhar baço, duro, é a arrogância sêca...), sempre uma enorme falta de chá, convenhamos...) não resisto a postar, aqui, alguns excertos da obra que considero admiráveis:
"(...) Mas, com Emma, as coisas começaram a decompor-se. Ela significava a extremidade dalguma coisa, a sua beleza constituía uma exorbitância e, como tal, um perigo.
O que sentiram as senhoras Mellos quando a viram vestida como para casar, de branco e com um sorriso indefinível, ligeiramente cruel, como se fosse um animal de presa farejando a sua dieta de sangue quente, não foi nada agradável (...)
- Não sei explicar...A beleza dela confunde-se com uma espécie de génio (...)
Quanto a Emma, as irmãs Mellos sabiam que ela não possuía uma cultura. Era completamente desafectada de tudo, inclusive da beleza que tinha e do orgulho ou ambição que ela podia desencadear. Limitava-se, com quinze anos feitos, a inclinar-se da varanda do jardim e interrogar toda a gente que passava. Usava um tom desprendido, como se fosse uma princesa que via mover-se o mundo a seus pés, mas com o qual não tinha muito em comum. Não por vaidade, mas por pura desinibição e desfrute do seu tempo. Respondiam-lhe com a altivez amigável que se estabelece entre gente que dispensa a resistência de classes. Eram seus inimigos por princípio e, ao mesmo tempo, reciprocamente reconheciam-se como motivo para agir. O que uma pessoa vê na outra não é o seu semelhante mas o seu dissemelhante, o que lhe proporciona espontaneidade dos seus actos."
Simplesmente sublime!, como esta Senhora consegue, por palavras, comunicar o indescritível!
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